12 de abril de 2014


Beijinho no ombro
Em referência aos estudos de filosofia que se passam em Brasília.

Diante dos fatos, vamos pensar alguns detalhes:
1.       Funk Beijinho no ombro
2.       Recalque
3.       Pensadores
4.       Educação
 
Beijo da Morte, de um cemitério em Barcelona
Funk Beijinho no ombro: existem muitos funkeiros ligados nas questões sociais (vide Rede Funk Social, vide Mc Garden, vide trabalhos de Juarez Dayrell). Não parece ser o caso dessa moça. Seu clip deixa claro a vida de princesa que ela pretende, isto é, sonha com a mais alta burguesia possível neste mundo. Além do mais, há no clip da música em questão algo da ordem monástica, em que seus acólitos, como tais, devem ficar sempre em silenciosa obediência. Popozuda diz até que acredita em Deus e faz dele seu escudo. Está mais pra componente do rebanho de São Pedro. Resumindo, as imagens veiculadas representam antes de tudo uma ofensa para quem pensa. A letra afirma comportamentos e atitudes mais típicos de uma adolescência hipererotizada e sedenta de prazeres. Ante seus possíveis fracassos ou brigas entre competidores, sobra recalque.
Recalque: Termo utilizado por Sigmund Freud, primeiramente em seus trabalhos relacionados com as psiconeuroses de defesa, no final do século XIX.  Em mais de uma ocasião Freud o referiu como a parte mais essencial da psicanálise (maiores detalhes, vide o artigo de mesmo nome, de 1915). Apresenta o modo de defesa sobre os representantes da pulsão, algo que fica a parte dos registros de consciência aceitáveis pelo “eu”. Em linhas gerais, é uma forma que nós mesmos inventamos para repelir representações desagradáveis. Nesta linha de entendimento, vivemos mesmo em uma sociedade recalcada. Freud, contudo, já havia alertado para os perigos iminentes, pois tudo que é recalcado retorna ao plano consciente de maneiras mais dolorosas (seu estudo é uma proposição necessária, muito difícil por sinal). “Keep calm e deixa de recalque”; “Beijinho no ombro pro recalque passar longe”, significa que há alguém entrando em “crise” [tipo rodando a baiana (que por sinal não têm nada a ver com isso, as baianas...)], fazendo um chilique por motivos bisonhos, por copiosa inveja. A ação defensiva consiste em “tiro, porrada e bomba”, ou seja, guerra sanguinária, é pra matar. Dar um “beijinho no ombro” é um sinal de desprezo para o recalque. Funciona também como exorcismo, tipo bater três vezes na madeira pra afastar o mal. Resumindo, o recalque na canção é um chilique de piriguetes. Passa longe do túmulo de Freud. Mas se há um conceito e um grande pensador no caso, é ele.

Pensadores: há, entre os pensadores, enorme dificuldade de reconhecimento. Indivíduos que hoje detém o título foram, em outras épocas, execrados publicamente e alguns até levados a juízo (pensar é uma das atividades mais perigosas que existem). Dificilmente vamos ver um pensador (um digno desse reconhecimento), com vida boa de princesa, cercado de acólitos, mimos e fru-frus. Certamente devemos tomar cuidado com pensadores contratados pelo governo para impor ideias e passar conceitos. São pensadores sim, sem dúvida, mas sua ética está sob suspeita.

Educação: faz muito tempo, no Brasil, que o “cabeção” foi substituído pelo “popozão”. "Aqui a bunda vale mais que a mente", critica Mc Garden. Trata-se de um processo de descerebralização da educação, que faz com que um par de nádegas valha muito mais que um par de cérebros (os hemisférios direito e esquerdo). Um par de cérebros produz ideias. Um par de nádegas, para além da estética, produz merda. Logo, os exemplos deploráveis questionados na educação atual vão na mesma latrina, digo, linha. Lamentável. A respeito da polêmica, claro que não passa de mais um aproveitamento midiático para atingir certos bestiários, digo, ideários. A mesma mídia que posa de defensora da educação vive de explorar os popozões que pululam no varejo.
Espanta-me o fato de o tal professor querer insistir na ideia de que a moça seja mesmo uma pensadora. Espanta-me falar dos pensadores franceses quando quem está em questão é um alemão maldito. Valei-me Sigismundo. Salve-me Zaratustra.
 
PS.: Pare o mundo, que eu quero descer.

Angelo Pereira Campos é Jardineiro. Em horas inexpressivas dedica-se a coisas de pouca monta, tais como filosofia e psicanálise.